Matéria publicada no Diário dos Fundos de Pensão aborda o uso de tecnologia no ensino de educação financeira para participantes mais idosos. O diretor da Engrenagem Virtual, Leonardo Rocha, foi um dos entrevistados. Confira:
Quando era criança em Rio Acima, no interior de Minas Gerais, Édios Ribeiro da Silva, 76 anos, levava para a escola em sua pasta uma pequena lousa preta que usava para fazer contas com um giz de pedra. Para ele, o smartphone atual é a versão bastante melhorada daquele seu material escolar de outrora. Por conta dessa experiência, logo depois de participar de um dos cursos de inclusão digital promovidos rotineiramente pela Fundação Banco Central de Previdência Privada (Centrus), sugeriu a montagem de algo semelhante para o uso do celular. Foi um sucesso total. “Com a tecnologia atual, é possível acompanhar tudo pela internet, Whatsapp e Facebook. É preciso estar conectado, senão a gente fica para trás”, diz Édios, que participou de vários cursos da Centrus e até se tornou um facilitador, fiel à carreira profissional na área de treinamento que desenvolveu no Banco Central.
Édios participa de um dos três planos administrados pela Centrus, que conta com cerca de 1,5 mil assistidos, metade formada por aposentados e a outra metade por pensionistas, e nenhum ativo. Entre os aposentados, a idade média é de 80 anos; entre os pensionistas, um pouco menos, conta Sérgio Almeida de Souza Lima, Secretário Executivo da Centrus. Nem todos são conectados como Édios e é um desafio para a fundação se comunicar com todos seus participantes. “Procuramos prestar as informações de todas as formas”, explica Sérgio, colocando os informativos no site da Centrus e também enviando correspondência em papel, embora esteja normativamente dispensado disso.
Ligando o computador – Além disso, a Centrus promove reuniões presenciais com os participantes, com apoio do próprio Banco Central e das associações de aposentados existentes em Brasília, Rio e nas principais cidades onde há ex-funcionários. O programa de educação digital é uma das atividades educativas presenciais, mantida há alguns anos. Começa com a explicação de como ligar o computador, segurar o mouse – atividades intuitivas para um jovem, mas que podem estressar um veterano – e chega ao uso de programas de texto e comunicação pelas redes sociais, e até os smartphones e tablets. Mais recentemente, a Centrus fez uma parceria com a organização não governamental CDI, especializada em inclusão digital, que fornece professores e instrutores em diversas cidades que podem dar o curso em locais cedidos pelas associações de aposentados, dispensando a fundação de deslocar seu próprio pessoal.
“Verificamos que o treinamento chega a promover mudanças na vida das pessoas por que o meio digital e as redes sociais ampliam as possibilidades de relacionamento para muitos deles que vivem sós. Nosso contato digital é permanente, mas não abrimos mão do papel”, diz Sérgio.
Canais azeitados – Manter os canais de comunicação digital e tradicional azeitados é um dos conselhos da Engrenagem Virtual, empresa especializada em comunicação e relacionamento para o contato entre as fundações e seus participantes, com programas específicos para difundir o conhecimento financeiro e previdenciário. “As culturas financeira e previdenciária não são fortes no país. Precisamos trabalhar essas informações de um modo lúdico”, afirma Leonardo Rocha, sócio-diretor da Engrenagem Virtual, explicando que a ideia é evitar o “economês” e economizar nas siglas, preferindo uma linguagem simples, familiar para mostrar como o mercado financeiro e as regras previdenciárias afetam a vida de cada um, apelando ainda para vídeos, jogos e infográficos.
A Engrenagem Virtual, inclusive, oferece aos fundos de pensão uma plataforma de comunicação e relacionamento com os participantes, no intuito de contribuir para a sua educação previdenciária e financeira. A Abrapp atua como facilitadora, ajudando no esforço de apresentação do produto ao quadro associativo.
Para Leonardo, a dificuldade das pessoas em lidar com o meio digital é cada vez menor. Para comprovar seu ponto de vista, ele faz algumas contas. Lembra que a internet surgiu no Brasil há 22 anos e conclui que apenas quem se aposentou há mais de 20 anos não tem alguma familiaridade com o meio digital, porque os demais chegaram a ver um computador ao menos no trabalho. Pesquisa feita pela Postalis, dos Correios, cuja grande maioria de participantes trabalha nas ruas, distribuindo correspondência, apurou que 99% acessam a internet, 78,5% de casa e 55% do trabalho ou casa de amigos. Com os smartphones e tablets a conexão é ainda mais fácil.
Dados da Secretaria de Políticas de Previdência Complementar (SPPC) mostram outro lado da questão. Em 2014, 83,6% dos aposentados dos fundos de pensão tinham mais de 55 anos; e 43%, mais de 65 anos. Entre os participantes ativos, 11,6% mais de 55 anos e 3,2%, de 65 anos.
De toda forma, Leonardo admite que nem todas as pessoas serão atingidas pelo meio digital, até porque gostam “do contato social, de ouvir e perguntar pessoalmente”. Por isso, a Engrenagem Virtual aconselha as fundações a conhecer seu público e manter a porta aberta, não só para os aposentados, mas também para os participantes ativos. “A comunicação digital sai mais barato. Uma palestra transmitida por streaming para 26 capitais sai bem mais em conta do que mandar um instrutor para cada um desses lugares. Mas não se pode negligenciar o contato off-line”, observa.
Economia – Reduzir o custo administrativo foi um dos principais motivos que levou a Fundação Cesp (Funcesp) a passar boa parte da comunicação impressa para o meio digital, informa Marcia Locachevic, Coordenadora da Comissão Técnica Nacional de Comunicação da Abrapp e responsável pela área na entidade, que tem 30 mil aposentados e 17 mil ativos. O dinheiro gasto com as correspondências foi revertido no investimento em tecnologia. Quando a mudança foi feita e os avisos de pagamento, extratos de gestão de saúde e outros comunicados passaram a estar disponíveis apenas no site, apenas 5% reclamaram e continuaram recebendo os informativos em papel.
A Funcesp também se preocupa em oferecer consultoria para o participante com dificuldade de utilizar o portal e, além disso, disponibiliza em áreas de atendimento presencial acesso à internet para que a pessoa aprenda a usar o sistema e se familiarize com as peculiaridades da navegação. A demanda por esse tipo de ajuda cresceu depois que o material impresso deixou de ser distribuído, conta Marcia.
Uma nova tendência no setor, informou, é o desenvolvimento e implantação de aplicativos que permitam ao participante por meio dos smartphones simular os resultados dos seus planos de previdência, consultar saldo de empréstimo, checar o extrato previdenciário, manter uma carteira eletrônica dos planos de saúde, levantar boletos, extratos de utilização e fazer todos os demais acompanhamentos. “Temos que oferecer o serviço na palma da mão. Afinal, hoje em dia, todos saem de casa com celular”, diz Marcia.
Contato pessoal – Sem deixar de lado a comunicação digital, a Fundação Celpos dedica atenção especial ao contato direto com os participantes, informa Rakel Azevedo, assessora de comunicação. Ao longo do ano, a Celpos realiza alguns eventos em que aproveita para distribuir informativos na forma de cartilhas e jornais e material de educação previdenciária e financeira no formato de tabuleiros em tamanho real, caça-palavras e outros tipos de jogos. A intenção, explica Rakel, é passar a informação de um modo lúdico para os cerca de 5 mil participantes, sendo 3,2 mil assistidos. Um desses eventos é o “EducaCelpos”, focado na educação financeira, quando os participantes podem acessar jogos em totens e, ao mesmo tempo em que adquirem informações, fazer contato com a tecnologia e se acostumar com a linguagem digital. Um produto que faz sucesso entre os participantes, conta Rakel, é o planejamento de bolso, uma espécie de caderneta em que se pode anotar receitas, despesas, consultas médicas e outros eventos com objetivo de promover o controle do orçamento.
Neste ano, a Celpos fará sua segunda semana da educação financeira, com workshop exclusivo para o público pouco familiarizado com a comunicação digital, com apoio Poupa mais Brasil, uma organização não governamental focada na questão do controle financeiro. Rakel pondera que os aposentados têm no país um papel importante de sustentação das famílias, onde não raras vezes é a principal fonte de renda nos dias de hoje. Neste ano, os aposentados serão incentivados a levar um acompanhante porque a Celpos quer envolver as famílias no planejamento financeiro. ( Chris Carvalho )